O Brasil e o Chile assinaram, nesta segunda-feira (5), 19 acordos e outros atos bilaterais em áreas que vão do turismo, ciência e tecnologia, defesa, agropecuária e direitos humanos até as relações comerciais e de investimentos. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está em visita oficial ao Chile e foi recebido pelo presidente do país, Gabriel Boric, no Palácio de La Moneda, em Santiago.
Os dois países têm mais de 90 acordos bilaterais em vigor e um comércio equilibrado, mas ainda pouco diversificado. Os acordos assinados hoje vão em busca dessa diversificação.
Em discurso, Lula destacou as colaborações pactuadas para a integração real entre os países, especialmente nas áreas de mudanças climáticas e turismo. “A integração sul-americana é uma realidade que faz a diferença na vida das pessoas, como demonstra o acordo de isenção de cobrança de roaming que firmamos no ano passado e o acordo de reconhecimento recíproco de carteiras de habilitação que assinamos hoje”, disse Lula.
“Além disso, os desafios representados pelas catástrofes naturais e pelo crime organizado atravessam países. Os incêndios de 2023 no Chile e as enchentes deste ano no Sul do Brasil põem em xeque o negacionismo climático e reforçam a necessidade de cooperação. A proposta chilena de estabelecer um mecanismo regional de resposta a desastres conta com nosso respaldo e nosso apoio”, acrescentou o presidente brasileiro.
Boric também reforçou a importância de atos que devem ampliar o fluxo comercial e turístico entre os dois países e ações conjuntas de combate crime organizado e ao tráfico de drogas. Durante o encontro foi assinado um tratado sobre extradição.
O Brasil é o terceiro maior parceiro comercial do Chile, com um intercâmbio comercial que atinge US$ 12,3 bilhões por ano. O país vizinho exporta para o Brasil, basicamente, cobre, pescados e minérios. Por outro lado, o Chile é o sexto maior destino das exportações do Brasil; petróleo, carne bovina e automóveis são os principais produtos exportados. A expectativa é que a conclusão da discussão sobre regras de origem do Acordo de Livre Comércio permita o aumento das exportações de automóveis, que são relevantes para o lado brasileiro.
O Brasil é o maior investidor latino-americano dentro do Chile, mais de US$ 4,5 bilhões, em setores como energia, serviços financeiros, alimentos, mineração, construção e fármacos. O Brasil também é o principal destino dos investimentos chilenos no exterior, com quase 30% do estoque total. As empresas chilenas atuam no Brasil em áreas como celulose, varejo e energia, sendo a companhia aérea Latam a maior empresa chilena em operação no Brasil.
Integração
A visita de Lula ocorre em momento de retomada do processo de integração da América do Sul. Brasil e Chile têm mais de 90 acordos bilaterais em vigor e são sócios, junto com Paraguai e Argentina, no Corredor Bioceânico, que ligará o Centro-Oeste brasileiro aos portos do Norte do Chile. A obra de infraestrutura estará concluída em pouco tempo, e os países discutem, agora, como garantir que os serviços fronteiriços e logísticos sejam ágeis e modernos. Os portos chilenos deverão desempenhar parte central da logística para o acesso a mercados do Pacífico.
O Chile tem se consolidado como o terceiro maior emissor de turistas para o Brasil, que, por sua vez, foi o segundo maior emissor de turistas para o Chile, em 2023. Entre os atos assinados hoje, está o plano de ação para implementação do acordo de turismo entre os dois países. O plano de ação prevê uma série de iniciativas que buscam facilitar e estimular ainda mais o fluxo turístico entre os dois países, intercâmbio de informações estatísticas turísticas, treinamento e assistência técnica entre os dois países e outras atividades.
Também foi estabelecido o reconhecimento recíproco de carteiras de habilitação entre os dois governos. Na área de comércio, foi assinado termo aditivo ao memorando de entendimento sobre certificação de orgânicos, para inclusão de algumas categorias de produtos.
No evento de hoje, ainda houve um momento de troca de condecorações entre Lula e o chileno Gabriel Boric.
Lula destacou a colaboração do Chile nos grupos de trabalho do G20, cuja presidência está com o Brasil, e Boric disse que o Chile vai integrar a Aliança Global contra a Fome a Pobreza, proposta pelo Brasil. Os dois mandatários têm posições coincidentes em vários temas da agenda global como a defesa da democracia, integração regional, meio ambiente, direitos humanos, inclusão social, direitos trabalhistas e a situação da Palestina.
O presidente brasileiro ainda convidou o chileno para participar da reunião de líderes contra o extremismo, que deve ocorrer à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em setembro, em Nova York. O encontro está sendo encabeçado por Lula e o presidente da Espanha, Pedro Sánchez.
Venezuela
Na política regional, entretanto, o presidente do Chile, Gabriel Boric, reagiu negativamente ao anúncio de que o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, teria sido reeleito nas eleições do último dia 28 de julho. Para Boric, os resultados anunciados eram "difíceis de acreditar". O governo da Venezuela expulsou a missão diplomática chilena do país, da mesma forma que fez com os diplomatas argentinos e peruanos. O Brasil ficará responsável por operar as embaixadas do Peru e da Argentina em Caracas.
Já o governo brasileiro insiste no diálogo e que a autoridade eleitoral venezuelana divulgue os dados das atas eleitorais por mesa de votação. Na semana passada, Brasil, Colômbia e México divulgaram uma nota conjunta pedindo que o impasse em torno das eleições da Venezuela seja resolvido pela via institucional.
Lula e Boric conversaram sobre o assunto e o brasileiro expôs as iniciativas que tem empreendido em relação ao processo político na Venezuela. “O respeito pela tolerância e pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados. O compromisso com a paz é que nos leva a conclamar as partes ao diálogo e promover o entendimento entre governo e oposição”, disse Lula, citando ainda a visita que fez ao Salão da Democracia e Memória, no Palácio de La Moneda.
“Lamentei que o Brasil tenha em sua história a triste mácula de ter apoiado a ditadura chilena. Sabemos que a arbitrariedade é inimiga do bem-estar e que a democracia não se sustenta sem um Estado que garanta direitos. Nos últimos anos, o Brasil experimentou uma versão tacanha da mesma combinação de autoritarismo político e neoliberalismo econômico”, completou.
Agenda
Lula chegou ao Chile na noite de domingo (4), e a visita oficial começou, na manhã de hoje (5), com a oferenda floral no monumento do general Bernardo O’Higgins, na Praça da Cidadania, em Santiago, um gesto tradicional de líderes que fazem visita de Estado ao país. O general foi o criador do Exército chileno e é considerado o pai da pátria do Chile por sua participação no processo de independência do império espanhol, que se consolidou em 1818.
Esta é a segunda visita oficial de Lula ao Chile, a primeira foi em agosto de 2004, em seu primeiro mandato. Esta viagem estava marcada para o mês de maio, mas foi adiada em razão da crise climática no Rio Grande do Sul. Já Boric esteve duas vezes no Brasil, na posse do presidente Lula, em janeiro de 2023, e na reunião de presidentes da América do Sul, em maio do ano passado.
Após o encontro com Boric e almoço oferecido pelo chileno à comitiva brasileira, Lula será recebido pelos chefes dos poderes Judiciário e Legislativo do Chile e deve se encontrar com representantes da Latam e da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). No final do dia, o presidente participa do encerramento do Fórum Empresarial Chile-Brasil, que deverá reunir cerca de 500 lideranças dos setores público e privado para discutir assuntos envolvendo o comércio entre os dois países.
Para esta terça-feira (6), estão previstos encontro com a prefeita de Santiago, Irací Hassler, e com o ex-presidente chileno Ricardo Lagos. A volta do presidente Lula para o Brasil está prevista para o início da tarde.