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Categoria: Agora 40graus
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Publicado: Segunda, 01 Fevereiro 2021 17:37
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Escrito por Redação
Apontado como um bom exemplo de gestão nos primeiros meses da pandemia, Portugal viu a situação sair totalmente de controle em janeiro. Com alta generalizada de novos casos, internações e mortes, além de um sistema de saúde próximo do limite, o mês acabou com um pedido de ajuda a outros países da União Europeia.
O descontrole do último mês se traduz em números. Janeiro concentrou mais de 42% dos contágios e quase 45% de todos os mortos por Covid-19 no país, que tem cerca de 10,1 milhão de habitantes. Foram 5.576 óbitos em 31 dias, contra 6.906 entre março e dezembro.
Nos últimos sete dias, o país tem o maior número mundial de novos casos diários por milhão de habitantes e está na vice-liderança das novas mortes por milhão de habitantes, de acordo com dados da Universidade Johns Hopkins.
"É evidente que nós estamos no pior período da pandemia. Desde a mortalidade, até o número de internações e de novos casos. Não há nenhum indicador que não esteja, nestes últimos dias, nas suas piores condições", avalia o epidemiologista Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública.
Com o aumento da demanda, o SNS (Sistema Nacional de Saúde), o sistema público de saúde, está próximo do limite. Cirurgias e consultas não urgentes foram suspensas, hospitais de campanha foram inaugurados e profissionais de outras áreas foram mobilizados para o combate à Covid-19. Mesmo assim, a situação em várias regiões é crítica.
No maior hospital do país, o Santa Maria, em Lisboa, as filas de ambulâncias se tornaram constantes. Em outras unidades, como o Garcia de Orta, em Almada, a situação é semelhante.
Diante desse cenário, o governo português apelou à ajuda internacional de outros países da União Europeia. A cooperação entre os Estados-membros é prevista no projeto europeu e já ocorreu em vários países durante a pandemia.
Devido à localização isolada de Portugal, na ponta da península Ibérica e com fronteiras terrestres apenas com a Espanha, a logística é mais complexa.
Mesmo assim, dois países já anunciaram reforços. Alemanha confirmou o envio de material hospitalar e respiradores, além de 26 profissionais de saúde (incluindo oito médicos), já na quarta-feira (3).
A Áustria disse ter disponibilidade para receber pacientes críticos de Portugal em seus hospitais.
"É um imperativo da solidariedade europeia ajudar de forma rápida e sem burocracias, com o objetivo de salvar vidas. A Áustria já aceitou na pandemia pacientes de cuidados intensivos da França, da Itália e de Montenegro, e irá agora também aceitar os de Portugal ", afirmou o chanceler, Sebastian Kurz, em suas redes sociais.
O envio de pacientes ainda não foi confirmado pelo ministério da Saúde, que, embora admita ajuda internacional, afirma que "todas as hipóteses estão sendo consideradas no sentido de continuar a assegurar os cuidados de saúde aos portugueses".
Para especialistas, o descontrole da pandemia em Portugal é multifatorial, mas é possível destacar as aglomerações no período de Natal e também a disseminação da variante britânica do Sars-CoV-2.
O ECDC (Centro Europeu de Controle e Prevenção de Doenças), em seu mais recente relatório, confirma essa análise, citando que o aumento de casos "foi atribuído principalmente ao relaxamento das medidas" nas festividades de fim de ano, mas também, de uma maneira menos extensa, à difusão da variante britânica em algumas regiões do país.
Na contramão de vários países europeus, que apertaram as restrições nas festas de fim de ano, Portugal decidiu deliberadamente afrouxar as regras. Entre 23 e 26 de dezembro, não houve restrição aos deslocamentos nem à quantidade de pessoas reunidas.
Mesmo com o aleta do governo britânico sobre a nova cepa do coronavírus em 14 de dezembro, Portugal seguiu recebendo, sem restrições, visitantes oriundos do Reino Unido, onde existe uma grande comunidade lusitana, durante mais de um mês.
Inquéritos epidemiológicos do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge indicam que a variante britânica está em disseminação rápida pelo país, com a probabilidade de se tornar dominante em breve.
Com o recorde de mortes -por Covid-19.e por outros fatores-, o país também tem seu sistema funerário sob pressão. Há filas de espera para enterros e cremações, e hospitais já instalaram câmaras frigoríficas adicionais para lidar com o aumento no número de corpos.
Em 15 de janeiro, quando a situação já se mostrava insustentável, o governo português avançou para um segundo confinamento geral. Com escolas e universidades abertas e várias exceções, o novo lockdown simplesmente não pegou.
Com o avanço dos números de contágios, as autoridades decidiram, uma semana depois, suspender as aulas presenciais e apertar as regras sobre o toque de recolher e funcionamento de estabelecimentos comerciais.
Mesmo assim, a queda nas infecções tem sido lenta.
No último fim de semana, o governo radicalizou as medidas e decidiu fechar as fronteiras do país, pelo menos, até 14 de fevereiro. O país também mandou cancelar todos os voos com destino ou origem ao Brasil.
LENTIDÃO NA VACINAÇÃO
Portugal também tem enfrentado críticas à implementação de seu plano nacional de vacinação. De acordo com o sistema de monitoramento do ECDC, o país é um dos mais lentos da UE no processo de administração das primeiras doses.
Responsável por divulgar os dados sobre a pandemia no país, a DGS (Direção-Geral da Saúde) não inclui a quantidade de vacinas disponíveis e administradas em seus boletins diários. Também não há informações sobre vacinados por região ou grupos prioritários.
Em meio à falta de transparência oficial, denúncias de pessoas furando fila e de desperdício de doses por negligência têm proliferado.
No caso mais recente, no último fim de semana, o diretor do Instituto Nacional de Emergência Médica no Norte do país pediu demissão após ter sido revelado que ele autorizara a vacinação de 11 funcionários –fora do grupo prioritário– da pastelaria que costuma frequentar.
Desde o começo da pandemia, Portugal já registrou 726.321 casos e 12.757 mortes por Covid-19.
Fonte: Folhapress (Giuliana Miranda)